
Apesar de a reforma trabalhista brasileira ter entrado em vigor em novembro de 2017, o assunto ainda suscita muita discussão, tanto a favor quanto contra. Quando comparada a outros países, podemos verificar que a diferença é enorme, mesmo após esta pequena remodelação. Tá certo que muitos dirão que na Europa ou nos Estados Unidos as oportunidades de trabalho, condições e nível salarial são por demais diferentes do Brasil. Mesmo assim, seguido o tema vem à tona.
Desta forma, o anglo-norte americano Maxwell Brewster, diretor de clientes internacionais da Fortus Group, também advogado no Estado de Nova Iorque e consultor em direito estrangeiro pela OAB-RS, faz algumas comparações. Porém, enfatizou ele, falar das leis trabalhistas norte-americanas numa comparação com as brasileiras é uma tarefa difícil e complexa, levando em conta a maior autonomia dos Estados dos EUA nesta esfera, ainda que o ordenamento federal estabeleça normas mínimas em certos assuntos laborais.
“Aqui, devido a esta dificuldade comparativa, a base de referência nos EUA serão as normas trabalhistas (Labor Standards) e a jurisprudência estadual do Estado de Nova Iorque, além do ordenamento federal, em que uma legislação importante é a Lei Federal de Normas Trabalhistas Justas (Fair Labor Standards Act) de 1938.”
Descanso – Referindo-se a certos temas, parece mesmo que as Leis Trabalhistas brasileiras estão ficando mais próximas ao padrão norte-americano, geralmente considerado de natureza liberal. Na reforma trabalhista, por exemplo, o período mínimo de descanso mudou de 1 hora para 30 minutos, o que é o mínimo geralmente em Nova Iorque, no caso de trabalho diurno.
Jornada e Hora Extra – No mesmo sentido, referente a jornadas de trabalho, num contexto de um acordo, a reforma trabalhista concedeu a possibilidade de aumentar a jornada de 8 horas por dia para 12 horas por dia, quando, por exemplo, no Estado de Nova Iorque não há limites referentes ao número de horas de uma jornada, sujeito a certas exceções. Porém, o ordenamento norte-americano se revela mais protecionista já que a Lei Federal de Normas Trabalhistas Justas estabelece que mais de 40 horas semanais são consideradas horas extras no caso de empregados com salários baixos. Em território brasileiro, o limite equivalente é de 44 horas. O Brasil se releva novamente mais protecionista quando se considera o limite de 2 horas extras por dia, quando não tem restrição nos EUA, só limitado, por exemplo, no Estado de Nova Iorque pelo número mínimo de horas de descanso semanais em certas profissões.
Contribuição Sindical – Tomando outro exemplo liberalizante na reforma trabalhista, a contribuição sindical agora é opcional, seguindo o exemplo de Estados norte-americanos com o assim chamado “direito de trabalhar (right to work)”. Nestes Estados com o “direito de trabalhar”, quando existe acordo sindical com o empregador, o empregado não é obrigado a aderir e pagar a contribuição, com algumas exceções. Porém, o Estado de Nova Iorque não é um destes Estados e, no caso de funcionários públicos, a contribuição sindical é obrigatória.
Fracionamento das férias – Referente ao fracionamento de férias, também a reforma trabalhista aplicou uma mudança liberalizante. Agora, podem ser fracionadas em três períodos, deixando o ordenamento um pouco mais parecido com a realidade nos EUA. Mas, ainda bem menos flexível, já que no vizinho do norte o costume é de conceder dias úteis de férias (diferente do Brasil, onde são concedidos dias calendários) que as pessoas tiram um por vez, por exemplo, para fazer um feriadão. Porém, nos EUA não existe nenhum direito a férias remuneradas sem um acordo neste sentido entre o empregador e o empregado.
Aviso Prévio – A reforma trabalhista não tocou em todos os aspectos das leis trabalhistas e a CLT reteve seu viés protecionista, por exemplo, referente ao aviso prévio. Assim, empregados têm direito a 30 dias de aviso prévio, acrescentando 3 dias a cada ano, até um máximo de 90 dias. Este é um exemplo de um privilégio que brasileiros tomam como certo, não existindo para nenhumas das partes em Nova Iorque e nem nos EUA como um todo. De fato, de acordo com a Lei Trabalhista de Nova Iorque § 195(6), empregadores devem fornecer aviso escrito a um empregado demitido dentro de cinco dias depois do término do vinculo com a data da demissão e a data de cancelamento de benefícios.
Rescisão sem Justa Causa – Outro aspecto que não mudou com a reforma trabalhista e manteve o viés protecionista foi o direito à indenização no caso de rescisão sem justa causa, mantendo um modelo contrário ao dos EUA. Lá, reina o modelo de “employment at will”, significando que no caso de um contrato de emprego de prazo indefinido, o empregado e empregador podem terminar o contrato sem justa causa e sem indenização, existindo algumas exceções. Por exemplo, no caso de demissão por discriminação devido à raça, religião, origem nacional, idade, deficiência, gênero, orientação sexual e estado civil.
Salário Mínimo – O protecionismo do Brasil é posto em dúvida quando se compara o salário mínimo brasileiro com o dos EUA. Aqui, o salário mínimo é de R$ 954,00, enquanto nos EUA é de $7,25 por hora, dando R$ 4.097,00 por mês, quando se toma como base 40 horas semanais e a taxa de câmbio de US$ 1/ R$ 3,26. Ademais, na cidade de Nova Iorque, por exemplo, onde para uma empresa com mais de 11 empregados o salário mínimo é US$ 13,00 por hora, tomando 40 horas semanais como base e a taxa de câmbio de US$ 1/ R$ 3,26 o mensal, o que soma R$ 7.346,00. Porém, não se pode esquecer que os salários do Brasil escondem 90% a mais em encargos, o que aumentaria o salário mínimo para R$1.812,60.
Empregado x autônomo – O nível de protecionismo de trabalhadores no Brasil também pode não ser considerado numa extremidade do espectro quando se refere ao reconhecimento do autônomo como empregado. De acordo com a CLT, “considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual ao empregador, sob a dependência deste e mediante salário.” No Estado de Nova Iorque, existem princípios parecidos, referentes à dependência, supervisão, exclusividade, avaliação de desempenho, permissão para ausência, fornecimento de instalações e equipamento, controle sobre horas e negociação de remuneração. De qualquer forma, independentemente dos critérios, o fato é que no Estado de Nova Iorque os motoristas de aplicativo, desde 2017 são considerados empregados e não autônomos, sujeito a certas exceções.
Em conclusão, a reforma trabalhista deixou o ordenamento brasileiro um pouquinho mais próximo do norte-americano. Com a reforma, agora existe mais possibilidade de negociação entre as duas partes, seguindo mais o modelo norte-americano, que tem embutido mais espaço para negociação, acreditando que as pessoas são donas de si.
Dito isso, porém, identifico três aspectos em que as reformas poderiam ir além, seguindo, assim, o modelo norte-americano dentro do contexto brasileiro, com benefícios para empregadores, empregados e tribunais:
1 – Fracionamento de Férias – Eu modificaria as férias de 30 dias calendários para 22 dias úteis (deduzindo 8 dias de finas de semana), com a possibilidade de fracionar do jeito que as partes quiserem. Logo, empregadores poderiam diminuir ausências prolongadas de funcionários, e empregados poderiam ter a possibilidade de tirar um tempo de folga ao longo do ano, tendo uma chance maior de gozar do benefício quando realmente quisessem.
2 – Carteira de Trabalho – Eu aboliria a carteira de trabalho, pois considero-a uma burocracia desnecessária e não usada em muitos países, inclusive nos EUA. Isso, pelo fato de o contrato de trabalho e outras formalidades já estabelecerem o vínculo. Menos burocracia iria beneficiar empregadores, empregados e tribunais.
3 – Rescisão sem Justa Causa – Eu eliminaria o dever do empregador e do empregado de pagarem indenização no caso de rescisão sem justa causa, respeitando a autonomia das partes, de trabalhar com quem quisessem. Isso, aliviaria os tribunais, que teriam mais tempo para avaliar outras matérias.